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17 novembro 2022

A Casa

Sióg e Gaoth voltaram lentamente para a reentrância no outeiro que os tinha guardado. Limparam o terreno, agradeceram aos espíritos do lugar pela receção e proteção, e partiram.

- Quando chegamos ao Reino das Fadas do Oeste?

- Estamos perto...


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O barco seguia indolente a corrente, cada vez mais para sul. Cada vez mais na direção das Grandes Areias.

- Como te chamas?

- Ainda não te disse? Que distraída!

A fada do sul levanta-se e coloca-se entre o sol e Sióg, numa posição de desafio. Pernas abertas à largura dos ombros, mãos nas ancas e com a cabeça para cima.

- Misneach!

- Bem, lá que tens coragem, isso tens!

Ambas começaram a rir, às gargalhadas, como se o riso limpasse a tensão que ambas acumulavam...

- Para onde vamos, Misneach?

- Para casa, óbvio! Lá estamos em segurança. Só espero que a minha família não te assuste!

Sióg ficou preocupada, quando Misneach acabou de dizer aquilo. Aquele sorriso não lhe inspirava confiança.

Ao fim de algum tempo, o barco parou no meio do rio. Estacou, por completo. Ambas as fadas ficaram a olhar uma para a outra sem saber o que fazer. Misneach ainda tentou a sua magia do vento, mas sem efeito.

- Tubarões?

- O quê?

A rodear o navio andavam duas barbatanas de tubarão. Que ora se afastavam, ora se aproximavam.

- Aqui? Tão acima no rio?

- O que se passa Misneach?

- Não sei!

De repente, das águas saltam dois tubarões, prontos a abocanhá-las... Ambas gritam de pânico e fecham os olhos. Não havia fuga possível! Que horrível maneira de morrer!

- AH! AH! AH! Viste como caíram?

- Realmente! Ainda se chama ela de coragem? AH! AH! AH!

Sióg e Misneach abrem os olhos e, perante elas, estão dois fadas com cara redonda e traquina.

- GÉMEOS!!! Se a mãe sabe...

- O quê? Vais contar-lhe, é?

- VOU!

- Já te esqueceste daquela carta?

- ...

- Carta?

- Sióg! Não te metas... Isto é entre mim e os meus irmãos...

- Oh, mas temos aqui uma convidada!

- E do Reino do Oeste, irmão!

Sióg ri-se com a mudança de solenidade das expressões e comportamentos daqueles dois fadas tão diferentes da irmã.

- Minha senhora, dê-me o prazer de apresentar, sua senhoria, o meu irmão: Bradacha!

- E, a mim, minha senhora, de apresentar o meu irmão: Reibiliúnach!

- Muito prazer, caros cavaleiros! O meu nome é Sióg.

Acabadas as apresentações, todos começaram a rir-se, ao mesmo tempo que o barco voltava a seguir a corrente rio abaixo.

 

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Sióg permanecia absorta na imagem que tinha testemunhado. O peso daquele humano a morrer e ela...

- Voltemos Gaoth!

- ...

- Tenho de ir salvar aquele humano!

- Mas...

Gaoth calou-se. Sióg agradeceu-lhe e limpou as lágrimas que lhe escorriam pela face.




Rui M. Guerreiro, o guerreiro ruim