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01 setembro 2021

Parvo

Lá fora, a madrugada avisava o aproximar do sol. As cores do céu começavam a mudar. O orvalho a brilhar, como pequenas pérolas soltas pelos campos.

O cheiro da manhã começava a invadir os espaços, assim como o do café que trazia na mão.

Sentia o silêncio daquele momento de olhos fechados. Só de quando em vez, ouvia o cantar tímido de algum pássaro, a avisar a alvorada.

Entre pequenas sorvedelas, eu ia sentindo a luz a tomar conta do céu e da terra. Sem ver, sentia o mundo a crescer à minha volta, em mim. Um reflexo do meu interior.

Assim que o sol surgiu, abri os olhos. O café tinha-se acabado. O orvalho brilhava intenso. Os verdes estavam mais acentuados. Os pássaros começavam a esticar as asas. Os roedores procuravam abrigo.

A vida continuava, como sempre o fez. Mesmo que em mim tenha sido suspensa...

- Bom dia!

A Morte surgia no caminho. Sorridente. Com um olhar que levei tempo a reconhecer. Estava diferente. Mas ainda não tinha percebido porquê.

- Vou-te buscar um café. Queres?

- Sim, pode ser...

Assim que o acabou de dizer, sentou-se no degrau do alpendre.

Preparei o café e levei-o. No entanto, quando cruzei a porta, estaquei. A Morte chorava. Um choro baixo e lento. Um choro que só nas minhas vidas tinha escutado.

Sentei-me ao seu lado. Entreguei-lhe a caneca e fiquei em silêncio. Ambos ficámos ali, no degrau, com os nossos corpos encostados, as glicínias sobre nós, mas vidas distantes.

Eu aguardava. Ela chorava.

Até que ela me entregou a caneca. Aproveitei aquele momento para lhe pegar na mão e puxá-la para mim.

- Desculpa!

- Parvo!


Rui M. Guerreiro, o guerreiro ruim