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07 junho 2021

Ausência

Os dias foram passando sem a ver. A palavra saudade foi sendo gravada na minha mente e no coração.

Lá fora, a chuva caía, dia após dia. A terra já mostrava os sulcos da minha alma, escavados pelas águas correntes da montanha.

Deixei de sonhar com a criança, com o casal que tinha comprado aquele terreno, com...

A ausência da Morte, assim, repentina, criou-me um vazio. Uma dor inexplicável para mim. Eu que não sabia o que era o Amor, a Saudade... Agora, descubro mais um sentimento: a dor da ausência.

Os dias pesavam-me no coração. Sentia-o tão cheio de algo, mas não tinha para onde o vazar. Era algo tão estranho para mim. Como é possível ter esta sensação num simples órgão feito de células? Só a imagem: cheio? Mas cheio do quê? De sangue? Que disparate...

No entanto, apesar de racionalizar ao máximo o que se passava (como sempre faço, aliás!), sentia-me impelido a vivenciar coisas. Como é possível o corpo traduzir a nível físico o que estava algures dentro de mim?

A dor da ausência é realmente física. A saudade, também o é... Sinto-o em mim, nas lágrimas que me correm pelo rosto...

Lágrimas?

Não percebo o que se passa. Nunca senti isto. Nem nas memórias das minhas vidas eu encontro correspondência.

E se ela não voltar? O que faço àquilo que tenho no meu coração? O que faço a tudo o que sinto? Transformo em mais lágrimas?

Oh, não! Já penso no futuro! E que coisa é esta que sinto? É diferente das saudades, ou da ausência... É algo que me faz ter medo do futuro! Medo? É isto o medo?

Mas estarei a transformar-me num humano?

A minha cabeça deixa-se levar pelas palavras, argumentos e sentimentos... Perde-se num turbilhão, num redemoinho, de palavras e ideias e sentimentos. Não respiro!

De repente, começo a sentir-me com falta de ar. Tento respirar mais depressa, mas isso só piora. Começo a sentir que vou desfalecer, ou deixar de respirar... de morrer!

Espera, talvez, esta seja uma boa opção! Assim ela aparece...

Se eu morrer, a Morte tem que aparecer!

- Será que podes parar?

A voz vinha da porta da rua. Ela tinha voltado!

- Não te posso deixar uns dias e ficas logo assim?

Olho para ela e vejo que por detrás dela o sol surgia, colocando-a em contraluz. A chuva tinha parado e agora os raios de luz perfuravam as nuvens que tinha criado.

A alegria no meu peito era imensa! Alegria? Mas que raio... Então agora também sinto alegria?

- Queres um chá?



Rui M. Guerreiro, o guerreiro ruim