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09 março 2025

A estudante

Chovia. As gotas eram grossas e caiam fortes. Só o chapéu de bambu a protegia. No entanto, ela mantinha o seu passo determinado ao subir a montanha.

De vez em quando, parava. Olhava para cima e lembrava-se.

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- Desculpa, mas o teu pai morreu!

A notícia da morte do pai tinha-a entrado nos ouvidos, percorrido os nervos do corpo e saído como uma flecha no coração.

A dor levou-a a ajoelhar-se e a chorar. Foi a única reação que o corpo fora capaz de ter.

A mãe tentou abraçá-la, mas ela não deixou. Fugiu para a biblioteca do pai, onde os livros se espalhavam pelas prateleiras. Amontoavam-se na secretária...

A pergunta era sempre a mesma: «Pai, já leste isto tudo?». A resposta também era sempre a mesma: «Só nos meus sonhos!». Depois riam-se e acabavam abraçados a ler mais uma vez aquele livro que ela adorava.

Esta na biblioteca acalmava-a. Tocar nas lombadas de cada livro. Tirar um e ler só um parágrafo. Ler os títulos de forma solta e ligá-los...

«A dor da solidão, numa terra de sonho!», gritava o pai de repente e ela ria-se...

A morte do pai não era só uma ausência para ela. Era a perda de um mundo...

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Os passos mantinham-se seguros e fortes, contra as correntes de água que se tinham formado pelo caminho.

Passo a passo. Como se estivesse a ler um livro difícil. Parágrafo a parágrafo.

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No dia do funeral, a mãe aproximou-se dela e entregou-lhe um livro.

- Toma! O pai comprou para te dar...

Ela segurou no livro, enquanto o corpo do pai ardia na pira funerária.

Enquanto o pai se transformava em cinzas e fumo, o olhar dela transformava-se na silhueta da letra do pai.

«Para a vida que deu sentido à minha vida.», escreveu o pai na primeira página, debaixo do título.

Ela percorreu havidamente o livro, para tentar perceber o que tinha nas mãos, até que na última página estava a palavra "Guerreiro".

Olhou para a mãe. A mãe sorriu e respondeu-lhe à pergunta silenciosa.

- Há um guerreiro no topo daquela montanha que salvou o teu pai, quando ele se sentia perdido.

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Ali estava ela. Em busca de um guerreiro que a ajudasse a fazer sentido disto tudo. A subir uma montanha no meio de uma tempestade. A afundar em cada gota de chuva as lágrimas do vazio.

 

 

Rui, o guerreiro ruim